segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Infância vermelha

Os olhinhos de coelho
A língua da cadela princesa
O vestido de chita com flocos de neve
A sandália no pé de correr
A língua vermelha de pirulito
A maça do amor que se compra
O caju no pé de gangorra
O laço de fita pra enfeitar
O suco de correr pra vida
em flores partidas,
e o debruçar fazendo
suco de vida correr na face
Na maré salobra
No pano de mamão
No vestido branco
Na escada cinza
Na gude azul
No banco de vara
Na sombra de manga
Na linha de trem
Na ponte de coco
Na estrada de areia
Nas mãos da amada vovó
que carregava sua negra menina

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Início

Vou riscar seu nome e
apagar do meu papel.
Tudo se desfaz
E recomeça agora.

Medo

Senti suas mãos gélidas em meu cabelo.
Um fio de frio adentrava-me,
Da garganta, a voz explodia e cantava o vento.
Estava escuro.
Tomastes conta do meu enfermiço ser,
Consumistes-me.
Devorou-me por inteiro.

Encontro...

Foi tranqüilo entrar no azul e abraçar
Brancas nuvens de sal.
A areia acariciou meus pés.
Ouvi o silêncio que os ventoas cantavam...
No horizonte o Sol se punha.

Outra Luz vinha me iluminar

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Meu mal benéfico

Ainda no seu aniversario
Você disse que éramos amigos.
Você disse de verdade.
Eu acreditei.
Porque sempre disse
A você que acredito somente
Nas verdades,
E minha amizade por você
É de verdade.
Ainda ontem, te liguei,
Você atendeu ao telefone rouquido,
Parecia estar deitado e
Repousava a cabeça
Num travesseiro de algodão.
Conversamos pouco.
Desligou o telefone
Pedindo que lhe esperasse
Levantar da cama
Para melhor conversarmos,
Pois ligaria-me em seguida.
Fiquei a esperar que se levantasse e
Ligasse-me.
Demorou muito.
Uma demora grande
E quase eterna no esperar.
Percebi que você tinha dificuldades
Em levantar-se da cama...
Sentindo um fio de tristeza,
Pensei e
Concluí que você
Está engordando gradativamente,
E irá sim vestir-se de duplo G.
Percebi também que tem Mal de Alzheimer
E isso não é legal.
Não poderei está o tempo todo
Ao seu lado lembrando
Das varias responsabilidades
Que tens a cumprir.
Pois não estarei sempre ao seu lado.
Por que preciso de carinho,
Por que lhe proibir de esquecer de mim.

A saudade...

E dormir teu sono
e sonhar com o vento
que te leva um beijo meu

domingo, 12 de julho de 2009

O olhar basta

Em cada momento,
A cada tempo,

Ele escorre e já é outro.

Nunca o mesmo.


O vento, vem trazer-me a resposta
Que não foi dita.
O silêncio ainda preserva as estranhas
Palavras indescritíveis.

Ao espasmo do meu esmo
Decidi abrir-me.

Ao tocar;

E o imaginável ver,

O estranho, presente estava.

Sim, ali! Grande e forte

Seus olhos incógnitos em mim.
Sua boca. Um riso ignoto.

E todo o teu ser,

Eu senti.


Fitei-o um instante.

Instante que o vento não levou;

Que não escorreu.

Perdurou.


E ali suspenso...

Vasto,

Intenso e profundo...

O sentimento ficou.

E por muito tempo durou...


Estremecíamos.

Osculo.

De nós,

Nenhum asco.

Juliete Nascimento

terça-feira, 23 de junho de 2009

D'eu


Desenho
Fui morena e magrinha como qualquer polinésia,
e comia mamão, e mirava a flor da goiaba.
E as lágrimas me espiavam, entre os tijolos e as trepadeiras,
e as teias de aranha nas minhas árvores se entrelaçavam

Isso era um lugar de sol e nuvens brancas,
onde as rolas, à tarde, soluçavam mui saudosas...
O eco, burlão, de pedra, ia saltando,
entre vastas mangueiras que choviam ruivas horas.

Os pavões caminhavam tão naturais por meu caminho,
e os pombos tão felizes se alimentavam pelas escadas,
que era desnecessário crescer, pensar, escrever poemas,
pois a vida completa e bela e terna ali já estava.

Com a chuva caía das grossas nuvens, perfumosa!
E o papagaio como ficava sonolento!
O relógio era festa de ouro; e os gatos enigmáticos
fechavam os olhos, quando queriam caçar o tempo.

Vinham morcegos, à noite, picar os sapotis maduros,
e os grandes cães ladravam como nas noites do Império.
Mariposas, jasmins, tinhorões, vaga-lumes
moravam nos jardins sussurrantes e eternos.

E minha avó cantava e cosia. Cantava
canções de mar e de arvoredo, em língua antiga.
E eu sempre acreditei que havia música em seus dedos
e palavras de amor em minha roupa escritas.

Minha vida começa num vergel colorido,
por onde as noites eram só de luar e estrelas.
Levai-me aonde quiserdes! - aprendi com as primaveras
a deixar-me cortar e a voltar sempre inteira.
Cecília Meireles